quarta-feira, 8 de abril de 2015

É possível que parte do salário não seja paga em dinheiro, mas com alimentação, habitação, vestuário, etc?

A resposta encontra-se na Consolidação das Leis do Trabalho e na Lei 5.889/73. Primeiramente irei transcrever os artigos relevantes. Após, os explicarei e destacarei os entendimentos jurisprudenciais pertinentes:


CLT "Art. 82 Parágrafo único - O salário mínimo pago em dinheiro não será inferior a 30% (trinta por cento) do salário mínimo fixado para a região, zona ou subzona."



“Art. 458 - Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações "in natura" que a empresa, por fôrça do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

OBS: o cigarro também não se considera salário utilidade em face de sua nocividade à saúde. (súmula 367, II do TST)

§ 1º Os valôres atribuídos às prestações "in natura" deverão ser justos e razoáveis, não podendo exceder, em cada caso, os dos percentuais das parcelas componentes do salário-mínimo (arts. 81 e 82). (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

§ 2o Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas pelo empregador: (Redação dada pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

I – vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos aos empregados e utilizados no local de trabalho, para a prestação do serviço; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

OBS: A habitação, a energia elétrica e veículo fornecidos pelo empregador ao empregado, quando indispensáveis para a realização do trabalho, não têm natureza salarial, ainda que, no caso de veículo, seja ele utilizado pelo empregado também em atividades particulares. (súmula 367, I do TST)

II – educação, em estabelecimento de ensino próprio ou de terceiros, compreendendo os valores relativos a matrícula, mensalidade, anuidade, livros e material didático; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

III – transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno, em percurso servido ou não por transporte público; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

OBS: não confundir com horas in itinere, instituto regulado pela súmula 90 do TST, uma vez que a referida súmula define quando haverá cômputo na jornada de trabalho. O presente artigo esclarece quando haverá integração da prestação in natura no salário.

IV – assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante seguro-saúde; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

V – seguros de vida e de acidentes pessoais; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

VI – previdência privada; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)


VIII - o valor correspondente ao vale-cultura. (Incluído pela Lei nº 12.761, de 2012)

§ 3º - A habitação e a alimentação fornecidas como salário-utilidade deverão atender aos fins a que se destinam e não poderão exceder, respectivamente, a 25% (vinte e cinco por cento) e 20% (vinte por cento) do salário-contratual. (Incluído pela Lei nº 8.860, de 24.3.1994)

§ 4º - Tratando-se de habitação coletiva, o valor do salário-utilidade a ela correspondente será obtido mediante a divisão do justo valor da habitação pelo número de co-habitantes, vedada, em qualquer hipótese, a utilização da mesma unidade residencial por mais de uma família. (Incluído pela Lei nº 8.860, de 24.3.1994)

Lei 5.889/73:

"Art. 9º Salvo as hipóteses de autorização legal ou decisão judiciária, só poderão ser descontadas do empregado rural as seguintes parcelas, calculadas sobre o salário mínimo:

a) até o limite de 20% (vinte por cento) pela ocupação da morada;

b)até o limite de 25% (vinte por cento) pelo fornecimento de alimentação sadia e farta, atendidos os preços vigentes na região;.”



DOS PERCENTUAIS MÁXIMOS DO SALÁRIO “IN NATURA”:



Súmula Nº 258 do TST – Salário-utilidade. Percentuais – Os percentuais fixados em lei relativos ao salário “in natura” apenas se referem às hipóteses em que o empregado percebe salário mínimo, apurando-se, nas demais, o real valor da utilidade.


Ou seja, o limite de 70% do pagamento em salário “in natura”, os limites de 25%/20% e 20%/25% para os salários dos trabalhadores urbanos e rurais, para habitação e alimentação, respectivamente, se referem apenas a quem recebe o salário mínimo, para que a liberdade do trabalhador não seja tolhida ao eliminar excessivamente de seu salário valor em pecúnia. Para quem recebe salário acima do mínimo, apura-se o real valor da utilidade.

Julgamento efetuado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região ajuda a elucidar o tema:


"PODER JUDICIÁRIO FEDERAL

JUSTIÇA DO TRABALHO

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO

Gab Des Marcelo Augusto Souto de Oliveira

Av. Presidente Antonio Carlos, 251 7o andar - Gab.42

Castelo Rio de Janeiro 20020-010 RJ

PROCESSO: 0044100-32.2009.5.01.0241 – RTOrd

Súmula nº 258 do TST

SALÁRIO-UTILIDADE. PERCENTUAIS

Os percentuais fixados em lei relativos ao salário "in natura" apenas se referem às hipóteses em que o empregado percebe salário mínimo, apurando-se, nas demais, o real valor da utilidade.

Conclui-se, pois, que a utilidade alimentação não pode ultrapassar o percentual de vinte porcento do salário contratual, se for o salário mínimo, e que, nos salário superiores ao mínimo, a parcela in natura deve ser correspondente ao efetivo valor da utilidade.

No presente caso, a maior remuneração da autora correspondeu a R$ 522,93, em março de 2009, quando o salário mínimo era de R$ 465,00 (quatrocentos e sessenta e cinco reais). Portanto, recebia a autora valor salarial superior ao mínimo legal, de forma que deve ser apurada o real valor da utilidade.

Aplicando-se vinte porcento sobre o salário contratual da autora, chega-se ao valor de R$ 104,59 (cento e quatro reais e cinquenta e nove centavos), que, dividido por vinte e dois dias, em média, de labor mensal, chega-se ao valor diário de R$ 4,75 (quatro reais e setenta e cinco centavos).

Não tendo a reclamada comprovado o real valor despendido em cada lanche fornecido ao empregado, outra alternativa não há senão arbitrar um valor que, de forma razoável, represente o real valor da utilidade.

Nesse sentido, entendo que o valor alcançado segundo a decisão recorrida é consentâneo com o custo de um lanche espartano, não muito requintado.

Sendo assim, nego provimento ao recurso da reclamada , no particular."



DA CARACTERIZAÇÃO DO SALÁRIO IN NATURA


Porém, toda e qualquer alimentação fornecida pelo empregador integra o salário do trabalhador?


Súmula Nº 241 do TST – Salário-utilidade. Alimentação O vale para refeição, fornecido por força do contrato de trabalho, tem caráter salarial, integrando a remuneração do empregado, para todos os efeitos legais.

OJ SBDI 1 133. AJUDA ALIMENTAÇÃO. PAT. LEI Nº 6.321/76. NÃO INTEGRAÇÃO AO SALÁRIO. A ajuda alimentação fornecida por empresa participante do programa de alimentação ao trabalhador, instituído pela Lei nº 6.321/76, não tem caráter salarial. Portanto, não integra o salário para nenhum efeito legal.


Creio que a OJSBDI1 dispensa maiores comentários. Informo apenas que, de acordo com o MTE , o Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT foi instituído pela Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976 e regulamentado pelo Decreto nº 5, de 14 de janeiro de 1991, que priorizam o atendimento aos trabalhadores de baixa renda, isto é, aqueles que ganham até cinco salários mínimos mensais. Este Programa, estruturado na parceria entre Governo, empresa e trabalhador, tem como unidade gestora a Secretaria de Inspeção do Trabalho / Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho. A vantagem para a empresa que aderir ao programa é que poderá deduzir, do lucro tributável para fins do imposto sobre a renda o dobro das despesas comprovadamente realizadas no período base, em programas de alimentação do trabalhador, previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho na forma em que dispuser o Regulamento da Lei 6.321/76. (art. 1º da Lei 6.321)

Em relação à Súmula 241, devo tecer maiores considerações:

Para que o salário in natura seja caracterizado, ele deve atender a alguns requisitos: ser habitual e gratuito. A polêmica se instaura em relação ao segundo requisito: a gratuidade. Para caracterizar a gratuidade, o empregador não pode efetuar desconto no salário do empregado ou efetuar qualquer tipo de cobrança para o fornecimento da prestação in natura. Caso contrário, a natureza in natura é descaracterizada, de modo a não integrar o salário para os efeitos legais.

A título de exemplo, o Tribunal Superior do Trabalho, nos autos do processo E-RR - 824-14.2011.5.18.0012, decidiu que “a não-gratuidade na alimentação fornecida pela empresa descaracteriza a natureza salarial da verba.” (fonte)

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