sábado, 9 de maio de 2015

O que é o depósito recursal trabalhista? Quais os efeitos da concessão da justiça gratuita sobre o depósito recursal?

O depósito recursal está previsto no art. 899 da CLT:


"Art. 899 - Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções previstas neste Título, permitida a execução provisória até a penhora. (Redação dada pela Lei nº 5.442, de 24.5.1968) (Vide Lei nº 7.701, de 1988)

§ 1º Sendo a condenação de valor até 10 (dez) vêzes o salário-mínimo regional, nos dissídios individuais, só será admitido o recurso inclusive o extraordinário, mediante prévio depósito da respectiva importância. Transitada em julgado a decisão recorrida, ordenar-se-á o levantamento imediato da importância de depósito, em favor da parte vencedora, por simples despacho do juiz. (Redação dada pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 2º Tratando-se de condenação de valor indeterminado, o depósito corresponderá ao que fôr arbitrado, para efeito de custas, pela Junta ou Juízo de Direito, até o limite de 10 (dez) vêzes o salário-mínimo da região. (Redação dada pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 4º - O depósito de que trata o § 1º far-se-á na conta vinculada do empregado a que se refere o art. 2º da Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, aplicando-se-lhe os preceitos dessa Lei observado, quanto ao respectivo levantamento, o disposto no § 1º. (Redação dada pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 5º - Se o empregado ainda não tiver conta vinculada aberta em seu nome, nos termos do art. 2º da Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, a empresa procederá à respectiva abertura, para efeito do disposto no § 2º. (Redação dada pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 6º - Quando o valor da condenação, ou o arbitrado para fins de custas, exceder o limite de 10 (dez) vêzes o salário-mínimo da região, o depósito para fins de recursos será limitado a êste valor. (Incluído pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 7o No ato de interposição do agravo de instrumento, o depósito recursal corresponderá a 50% (cinquenta por cento) do valor do depósito do recurso ao qual se pretende destrancar. (Incluído pela Lei nº 12.275, de 2010)

§ 8o Quando o agravo de instrumento tem a finalidade de destrancar recurso de revista que se insurge contra decisão que contraria a jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho, consubstanciada nas suas súmulas ou em orientação jurisprudencial, não haverá obrigatoriedade de se efetuar o depósito referido no § 7o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.015, de 2014)"


Primeiramente, deve-se notar que é privilégio da fazenda pública a dispensa de depósito para interposição de recurso, conforme art. 1º, IV do DECRETO-LEI No 779, DE 21 DE AGOSTO DE 1969.

Veja que o parágrafo quarto do art. 899 afirma que o depósito far-se-á na conta vinculada do trabalhador: é a mesma conta em que são feitos os depósitos do FGTS. A interpretação, portanto, é que não há que se falar em depósito recursal feito por parte do empregado. O objetivo do dispositivo legal é garantir o cumprimento da condenação imposta ao empregador, de modo que após o trânsito em julgado da decisão, o depósito será imediatamente levantado pelo empregado:

EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO RECURSAL POR PARTE DO RECLAMANTE. IMPOSSIBILIDADE - O depósito recursal não tem natureza jurídica de taxa de recurso, mas de garantia do juízo recursal (Instrução Normativa nº 03/93 do TST), ou seja, objetiva garantir o cumprimento da condenação. A medida é voltada exclusivamente para atender o interesse do trabalhador que, embora tendo de aguardar o julgamento do recurso interposto, terá a certeza de que ao menos parte do valor da condenação imposta encontra-se reservado para a execução da sentença.Ademais, embora o -caput- do art. 899 da CLT não declare expressamente que o depósito recursal é exigido apenas do recorrente empregador, tal conclusão é facilmente extraída dos parágrafos §§ 4º e 5º do mencionado dispositivo legal, quando estabelecem que o depósito far-se-á na conta vinculada do trabalhador, que deverá ser aberta em seu nome, se ainda não a tiver.Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 6330058220005105555 633005-82.2000.5.10.5555, Relator: Rider de Brito, Data de Julgamento: 17/12/2003, 5ª Turma,, Data de Publicação: DJ 26/03/2004.)

Posteriormente, a Lei 8.177/91 mudou a sistemática relativa aos depósitos recursais; modificou o critério do salário-mínimo regional para um valor fixo a ser atualizado por índices de atualização monetária:


Art. 40. O depósito recursal de que trata o art. 899 da Consolidação das Leis do Trabalho fica limitado a Cr$ 20.000.000,00 (vinte milhões de cruzeiros), nos casos de interposição de recurso ordinário, e de Cr$ 40.000.000,00 (quarenta milhões de cruzeiros), em se tratando de recurso de revista, embargos infringentes e recursos extraordinários, sendo devido a cada novo recurso interposto no decorrer do processo. (Redação dada pela Lei nº 8.542, de 1992).

§ 1° Em se tratando de condenação imposta em ação rescisória, o depósito recursal terá, como limite máximo, qualquer que seja o recurso, o valor de Cr$ 40.000.000,00 (quarenta milhões de cruzeiros). (Redação dada pela Lei nº 8.542, de 1992).

§ 2° A exigência de depósito aplica-se, igualmente, aos embargos, à execução e a qualquer recurso subseqüente do devedor. (Redação dada pela Lei nº 8.542, de 1992).

§ 3° O valor do recurso ordinário, quando interposto em dissídio coletivo, será equivalente ao quádruplo do previsto no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 8.542, de 1992).

§ 4° Os valores previstos neste artigo serão reajustados bimestralmente pela variação acumulada do INPC do IBGE dos dois meses imediatamente anteriores. (Incluído pela Lei nº 8.542, de 1992).


O TST regularmente procede à atualização dos valores, como pode-se observar em seu sítio eletrônico.

Surge uma grande dúvida: a concessão do benefício da justiça gratuita importa na desnecessidade de efetuar o depósito recursal para a interposição de recurso trabalhista?

Segue transcrição do art. 3º da lei 1.060/50, a qual estabelece normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados.:


Art. 3º. A assistência judiciária compreende as seguintes isenções: (Vide Lei n º 13.105, de 2015) (Vigência)

I - das taxas judiciárias e dos selos;

II - dos emolumentos e custas devidos aos Juízes, órgãos do Ministério Público e serventuários da justiça;

III - das despesas com as publicações indispensáveis no jornal encarregado da divulgação dos atos oficiais;

IV - das indenizações devidas às testemunhas que, quando empregados, receberão do empregador salário integral, como se em serviço estivessem, ressalvado o direito regressivo contra o poder público federal, no Distrito Federal e nos Territórios; ou contra o poder público estadual, nos Estados;

V - dos honorários de advogado e peritos.

VI – das despesas com a realização do exame de código genético – DNA que for requisitado pela autoridade judiciária nas ações de investigação de paternidade ou maternidade. (Incluído pela Lei nº 10.317, de 2001)

VII – dos depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).


Veja que o inciso VII aparentemente responde a questão. O beneficiado pela justiça gratuita também está isento de efetuar o depósito recursal trabalhista:

JUSTIÇA GRATUITA. AMPLITUDE. AUSÊNCIA DE DEPÓSITO RECURSAL. DESERÇÃO NÃO CARACTERIZADA. A atual redação do inciso VII ao art. 3º da Lei nº 1.060/50 dispõe que a assistência judiciária gratuita concedida compreende a isenção "dos depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório". (TRT-5 - RecOrd: 00006238720135050020 BA 0000623-87.2013.5.05.0020, Relator: RENATO MÁRIO BORGES SIMÕES, 2ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 24/10/2014.)

Porém, mesmo com a clareza do dispositivo legal, o TST, de forma surpreendente, manteve o entendimento anterior à Lei Complementar nº 132/2009, no que tange à necessidade do depósito recursal. O argumento pode ser observado a seguir:

PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. NÃO ABRANGÊNCIA DO DEPÓSITO RECURSAL. NÃO APLICAÇÃO DO TEOR DO ART. 3º, INCISO VII, DA LEI Nº 1.060/50, COM ALTERAÇÃO DA LC Nº 132/2009, AO PROCESSO DO TRABALHO. A concessão de assistência judiciária gratuita, no âmbito do processo do trabalho, não implica a dispensa de que seja efetuado o depósito recursal, dada a sua natureza de garantia do juízo da execução. Nesse sentido é o entendimento prevalecente desta Corte. Esclareça-se, por oportuno, que não se aplica o disposto no inciso VII do art. 3º da Lei nº 1.060/50, com a alteração dada pelaLei Complementar nº 132/2009, ao processo trabalhista. O preceptivo assim dispõe: "Art. 3º. A assistência judiciária compreende as seguintes isenções VII - dos depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório". A alteração implementada no art. 3º da Lei nº 1.060/50, que conferiu nova redação ao seu inciso VII como citado, decorreu da Lei Complementar nº 132, de 2009, cujo principal objetivo foi alterar os dispositivos da Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994, que se refere, essencialmente, à organização da Defensoria Pública. Tem-se que os preceitos constantes da referida Lei nº 1.060/50, incluindo-se a redação do inciso VII do seu art. 3º conferida mediante Lei Complementar, ainda que de hierarquia superior, somente têm aplicação ao processo do trabalho quando houver omissão na legislação trabalhista e, ainda assim, apenas naquilo em que com ele for compatível. Esse é o princípio norteador da incidência ou não dos preceitos constantes de diplomas legais inseridos no ordenamento jurídico civil de forma subsidiária à sistemática trabalhista, nos exatos termos do art. 769 da CLT. E é exatamente sob essa ótica que se impõe concluir pela impossibilidade de aplicação do teor do art. 3º, inciso VII, da Lei nº 1.060/50, com a redação conferida pela Lei Complementar nº 132 de 2009, ao processo do trabalho relativamente ao depósito recursal, visto que, nesta esfera, tal depósito constitui garantia do juízo da execução, que, ao final de demanda, poderá ser levantado de imediato pelo autor da ação caso vencedor, não se identificando, portanto, com aqueles "depósitos previstos em lei para interposição de recurso" de que trata a lei. Recurso de revista não conhecido . (...) (TST - RR: 11390820125060411 , Relator: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 25/03/2015, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/03/2015)

Me parece que a decisão do Colendo Tribunal Superior do Trabalho é absurda, sem nexo algum. O argumento é fraquíssimo, desprovido de lógica. Ao meu ver, foi mais uma tentativa desesperada de manter um benefício para os trabalhadores, ao total arrepio da lei. 

O desiderato do dispositivo legal foi maximizar a força normativa da Constituição, ao garantir o contraditório e ampla defesa para os necessitados.

Infelizmente, há variados casos em que o TST atua como legislador, de modo a não observar a lei. Outro exemplo seria a súmula 353, que será analisada em outro artigo. 

Por fim, a dúvida é se o STF conheceria de eventual recurso extraordinário interposto da decisão acima exposta, sob o argumento da violação do art. 5º, LXXIV da Constituição Federal. Aguardemos!

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