O artigo de hoje se baseia na seguinte questão:
MPT – 16º Concurso
2) Descreva as funções dos direitos fundamentais, explicitando também a sua articulação com o princípio da dignidade da pessoa humana, indicando, quanto a este, abrangência conceitual, conteúdo, aplicabilidade, dimensões e alcance.
DAS FUNÇÕES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
De acordo com Zulmar Fachin, Gomes Canotilho (Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6. Ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 407-410) menciona as seguintes funções dos direitos fundamentais: função de defesa ou de liberdade; função de prestação social; função de proteção perante terceiros; função de não discriminação.
A função de defesa relaciona-se com os direitos fundamentais de primeira geração, com o dever geral de abstenção do Estado em certas atividades. A título de exemplo, temos o art. 5º, IV da CF: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”
A função de prestação social associa-se à ideia de direito fundamental de segunda geração. Superada a fase negativa do Estado, surge sua fase positiva, em que deve atuar para beneficiar os cidadãos. Temos como exemplo os direitos fundamentais à saúde, à educação, à moradia, ao transporte coletivo etc.
A função de proteção perante terceiros liga-se à Teoria da Repercussão dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas.
Conforme ensinamento de Cristiane Paglione Alves:
"Enquanto a eficácia vertical é a aplicação dos direitos fundamentais nas relações particular-Estado, a eficácia horizontal é a aplicação dos direitos fundamentais às relações entre particulares. Como a relação entre particulares é, ao menos teoricamente, de coordenação, de igualdade jurídica, quando os direitos fundamentais são aplicados a essas relações, se fala que os direitos fundamentais têm uma eficácia horizontal ou privada."
O art. 5º, V da CF exemplifica a referida função: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;”
Já a função de não discriminação tem como principal sustentáculo o seguinte dispositivo constitucional: Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)
É função de todos os direitos fundamentais garantir que o Estado trate seus cidadãos como iguais.
DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Magno Federici Gomes e Frederico Oliveira Freitas elaboraram excelente artigo sobre o assunto.
“Dworkin, ao tratar do conteúdo da dignidade da pessoa humana, acaba reportando-se direta e expressamente à doutrina de Kant, ao relembrar que o ser humano não poderá jamais ser tratado como objeto, isto é, como mero instrumento para realização dos fins alheios, destacando, todavia, que tal postulado não exige que nunca se coloque alguém em situação de desvantagem em prol de outrem, mas sim, que as pessoas nunca poderão ser tratadas de tal forma que se venha a negar a importância distintiva de suas próprias vidas”. (SARLET, Ingo Wolfgang. As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma compreensão jurídico-constitucional necessária e possível. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional, 2. ed. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2009, p. 36, citando a DWORKIN, Ronald. El domínio de la vida: una discusión acerca del aborto, la eutanasia y la liberdad individual. Barcelona: Ariel, 1998, p. 307-310.)
Flórez Valdés afirma que a dignidade da pessoa humana possui certos aspectos notáveis:
a) igualdade de direitos entre os homens, uma vez integrarem a sociedade como pessoas e não como cidadãos; b) garantia de independência e autonomia do ser humano, de forma a obstar toda coação externa ao desenvolvimento de sua personalidade, bem como toda atuação que implique na sua degradação; c) não admissibilidade da negativa dos meios fundamentais para o desenvolvimento de alguém como pessoa ou a imposição de condições subumanas de vida” (FLÓREZ VALDÉS, Joaquín Arce y. Los principios generales del derecho y su formulación constitucional. Madri: Editora Civitas, 1990, p. 149.).
Na preleção de José Afonso da Silva (2007) “a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida” (SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à constituição – ob. cit., 2007, p. 38.).
Como se pode observar, a maior função dos direitos fundamentais é justamente assegurar a dignidade da pessoa humana. As quatro funções anteriormente citadas nada mais são do que a garantia de que o indivíduo não será tratado como um mero objeto a fim de satisfazer interesses mesquinhos de outrem.
Ademais, como demonstrou Nadya Regina Gusella Tonial, a dignidade da pessoa humana pode ser abordada sob suas diversas dimensões: ontológica, intersubjetiva e histórico-cultural.
Na dimensão ontológica, a dignidade entende-se como atributo inato ao ser humano. Se toda pessoa tem capacidade de raciocinar, pode também autodeterminar-se: os seres humanos devem ter autonomia para pautar suas ações.
Quanto à dimensão intersubjetiva, pode-se afirmar que é traduzida em uma variedade de deveres e direitos que existem a fim de garantir o bem estar coletivo.
Já a faceta histórico-cultural da dignidade mostra que esta não é estática no tempo, mas tem seu conceito modificado pelas diferentes gerações e culturas.
Além disso, a dignidade pode ser vista simultaneamente como limite e como tarefa. Limite porque os indivíduos e o Estado não poderão intervir de modo a ferir a dignidade da pessoa humana. Tarefa pois deverão agir de modo a garanti-la.
Nenhum comentário:
Postar um comentário