sábado, 30 de maio de 2015

A correta indicação da autoridade coatora no mandado de segurança. Exemplos práticos.

A LEI Nº 12.016, DE 7 DE AGOSTO DE 2009, que disciplina o mandado de segurança individual e coletivo e dá outras providências, prevê em seu art. Art. 6o, § 3o : “Considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática. ”

É preleção de HELY LOPES MEIRELLES, ARNOLDO WALD e GILMAR FERREIRA MENDES (“Mandado de Segurança e Ações Constitucionais”, p. 70/71, item n. 8, 33ª ed., 2010, Malheiros):

“Incabível é a segurança contra autoridade que não disponha de competência para corrigir a ilegalidade impugnada. A impetração deverá ser sempre dirigida contra a autoridade que tenha poderes e meios para praticar o ato ordenado pelo Judiciário. (…). 
(…) Se as providências pedidas no mandado não são da alçada do impetrado, o impetrante é carecedor da segurança contra aquela autoridade, por falta de legitimação passiva para responder pelo ato impugnado. (…).”

A seguir, alguns casos práticos para auxiliar o leitor no entendimento da matéria:


1 ATO DE JUIZ DEVIDO À CARTA DE ORDEM EXPEDIDA PELO PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO


MANDADO DE SEGURANÇA. AUTORIDADE COATORA. ILEGITIMIDADE. A autoridade legítima para figurar no pólo passivo do mandado de segurança é aquela que dá a ordem para o cumprimento do ato impugnado, por ser a que participa da formação de vontade e detém a competência para desfazer o ato. O mero executor de ordem emanada de autoridade superior não pode ser imputado como autoridade coatora. No caso dos autos, o Impetrante apontou como autoridade coatora o Juiz da execução, o qual simplesmente deu cumprimento à determinação de seqüestro de verba pública contida em carta de ordem expedida pela Juíza Presidente do Tribunal Regional do Trabalho respectivo.Processo julgado extinto, sem resolução do mérito. (TST - RXOFMS: 692003720035120000 69200-37.2003.5.12.0000, Relator: Emmanoel Pereira, Data de Julgamento: 16/05/2006, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais,, Data de Publicação: DJ 09/06/2006.)


2 ATO DE AGENTE PÚBLICO ORDENADO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO


MANDADO DE SEGURANÇA – AUTORIDADE COATORA ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. A legitimação para o mandado de segurança é definida considerada a autoria do ato atacado, não cabendo cogitar de tal qualificação quando agente público limita-se a atender ao que imposto pelo Tribunal de Contas da União. REMUNERAÇÃO – DESCONTO – LEI Nº 8.443/92. A regra do artigo 7º, inciso X, da Constituição Federal sofre temperamento, ante a óptica do constituinte originário, decorrente da remessa a lei, cumprindo, quanto a esta, observar o princípio da especialidade, ou seja, o disposto na Lei nº 8.443/92. (STF - MS: 31239 GO , Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 04/09/2012, Data de Publicação: DJe-183 DIVULG 17-09-2012 PUBLIC 18-09-2012)


3 EXISTÊNCIA DE AUTORIDADE DE HIERARQUIA SUPERIOR


MANDADO DE SEGURANÇA. CARÊNCIA DA AÇÃO. ILEGITIMIDADE DE PARTE. 1. A correta indicação da autoridade coatora, em mandado de segurança, é de sumular importância haja vista tratar-se da autoridade com reais poderes para cumprir a ordem judicial no sentido de executar ou deixar de executar o ato tido como ilegal ou abusivo. 2. Se o ato combatido no mandado de segurança emana do Auditor Fiscal e não da Delegada Regional do Trabalho, o fato de estar aquele hierarquicamente subordinado à segunda não confere a esta a qualidade de autoridade coatora uma vez não ser esta a praticante do ato. Carência da ação declarada de ofício para extinguir o processo sem julgamento de mérito, com fulcro no art. 267, VI do CPC. O presente voto, ou parte dele, é fruto de minuta aprovada pela Exmª Juíza Relatora originária e, em razão da Resolução Administrativa nº 06/2008-(1087), publicada no DJU de 14.Mar.2008, p. 955, referendada pelo atual Relator. (TRT-10 - RO: 1094200600310002 DF 01094-2006-003-10-00-2 , Relator: Juiz Jose Leone Cordeiro Leite, Data de Julgamento: 11/06/2008, 2ª Turma, Data de Publicação: 04/07/2008)


4 LANÇAMENTO FISCAL


EMENTA - MANDADO DE SEGURANÇA - TRIBUTÁRIO - ANULAÇÃO DO LANÇAMENTO - AUTORIDADE COATORA - SECRETÁRIO DE ESTADO DA FAZENDA - ILEGITIMIDADE PASSIVA - PRELIMINAR ACOLHIDA O Secretário de Estado da Fazenda não é parte legítima para figurar no pólo passivo do mandado de segurança, que visa a anulação de lançamento tributário lavrada por delegado fiscal que apurou a irregularidade. (TJ-MG - MS: 10000110814563000 MG , Relator: Kildare Carvalho, Data de Julgamento: 25/04/2013, Câmaras Cíveis / 3ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 10/05/2013)


5 INTERPOSIÇÃO DE RECURSO CONTRA ATO DO PREGOEIRO - LICITAÇÃO


ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. RECURSO CONTRA ATO DO PREGOEIRO. INDICAÇÃO ERRÔNEA DA AUTORIDADE COATORA. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. I - A interposição de recurso administrativo contra ato do pregoeiro, como no caso, transfere à competente instância revisora, nos termos do Decreto nº 5.450/2005, a responsabilidade pela adjudicação do objeto da licitação. Desse modo, não se inserindo mais na esfera de competência do pregoeiro a pleiteada inabilitação da empresa vencedora do certame, é aquele parte ilegítima para figurar no polo passivo do vertente mandamus. II - Em sendo assim, diante da indicação errônea da autoridade apontada como coatora, a extinção do presente feito, sem resolução do mérito, é medida que se impõe, porquanto vedada a substituição, de ofício, do polo passivo, na impetração. Precedentes. III - Apelação desprovida. (TRF-1 - AMS: 200834000292888 DF 2008.34.00.029288-8, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, Data de Julgamento: 26/08/2013, QUINTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.51 de 05/09/2013)


6 CONCURSO PÚBLICO


ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. AUTORIDADE COATORA. PRESIDENTE DA COMISSÃO ORGANIZADORA DO CONCURSO. LEGITIMIDADE PASSIVA. I - Na inteligência jurisprudencial do egrégio Superior Tribunal de Justiça, "a autoridade coatora é quem executa o ato que se busca afastar, e não o responsável pela norma na qual se ampara" (Mandado de Segurança nº. 6736/DF, Relator Ministro Franciulli Neto, Primeira Seção, DJ 25/02/2002, p. 192). Em sendo assim, na espécie dos autos, afigura-se legitimado como autoridade impetrada, o presidente da comissão organizadora do concurso, que, nos termos do edital de regência, é a autoridade administrativa responsável pela prática do ato impugnado, assim como para retificação do respectivo ato, na espécie. II - Apelação parcialmente provida. Sentença anulada. (TRF-1 - AMS: 200840000026777 PI 2008.40.00.002677-7, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, Data de Julgamento: 04/09/2013, QUINTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.89 de 17/09/2013)

quarta-feira, 27 de maio de 2015

DANO MORAL, ASSÉDIO MORAL E ASSÉDIO SEXUAL; UMA BREVE ANÁLISE.

CONCEITUAÇÃO DE DANO MORAL

Dano moral pode ser conceituado como lesão a bem extrapatrimonial, aos direitos de personalidade, como o nome, honra, respeitabilidade, intimidade, imagem, etc.

Certos doutrinadores entendem que dano moral seria a compensação da dor íntima.

“Dano moral, portanto, é a dor resultante da violação de um bem juridicamente tutelado, sem repercussão patrimonial. Seja dor física – dor-sensação, como a denominada Carpenter – nascida de uma lesão material; seja a dor moral – dor-sentimento, de causa imaterial.” (CAHALI, 2011, pag. 28).

Porém, ao meu ver, tal conceito é equivocado, pois já é pacificado que a pessoa jurídica pode sofrer dano moral.

“A reparabilidade do dano moral causado à pessoa jurídica ainda apresenta alguma perplexidade e sofre forte resistência de parte da doutrina e jurisprudência apegadas à noção de que a honra é bem personalíssimo, exclusivo do ser humano, não sendo possível reconhece-la na pessoa jurídica. Concorre também para a resistência a ideia de que o dano moral é sinônimo de dor, sofrimento, tristeza etc.” (CAVALIERI, 2008, p. 96).

O Código Civil estabelece: “Art. 52. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos de personalidade.” Portanto, mostra-se claramente cabível a indenização por danos morais à pessoa jurídica. Saliente-se que o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 227 com o seguinte teor: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”.

DANO MORAL E TEORIA DA REPERCUSSÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS

Podemos ainda relacionar o dano moral à eficácia horizontal dos direitos fundamentais (Teoria da Repercussão dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas).

Os direitos fundamentais originalmente surgiram a fim de limitar o poder do Estado (direitos fundamentais de primeira geração). Portanto, há doutrina estrangeira que sustenta a não aplicabilidade dos direitos fundamentais às relações privadas, uma vez que nestas vigora o Direito Civil e princípios como o pacta sunt servanda (autonomia da vontade), de sorte a ocorrer uma separação entre Direito Constitucional e Direito Civil.

No Brasil não há como argumentar em tal sentido. Ao contrário da constituição de outros países, a Constituição Federal brasileira não restringe a aplicação dos direitos fundamentais.

A Constituição expressamente garante, por exemplo, a inviolabilidade dos direitos de personalidade, como se observa a partir do conteúdo de seu art. 5º, X – “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;”

É de fácil percepção que o dispositivo guarda conexão com os direitos de personalidades informados pelo Còdigo Civil, a partir de seu art. 11.

Além do mais, de acordo com Canotilho:

“... devemos entender o princípio da máxima efetividade da Constituição como aquele que “a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê. É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais, e embora a sua origem esteja ligada à tese da actualidade das normas programáticas (Thoma), é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais (no caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais).” (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional, 5a edição, Coimbra, Portugal, Livraria Almedina, pág. 1208)

ASSÉDIO MORAL VERTICAL DESCENDENTE, ASSÉDIO MORAL VERTICAL ASCENDENTE E ASSÉDIO MORAL HORIZONTAL

De acordo com Adriane Reis de Araujo (Rev. TST, Brasília, vol. 73, no 2, abr/jun 2007, pg. 206), a denominação “assédio moral” foi utilizada pela primeira vez em 1998 por Marie-France Hirigoyen que, em 2002, aprimora seu conceito e propõe a seguinte definição: 

“(...) o assédio moral no trabalho é definido como qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude...) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho." (HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. Tradução Rejane Janowitzer. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, p. 17.)

Tendo em vista o conceito de assédio moral, fica evidente que gera indenização por dano moral, devido à lesão a direito de personalidade (honra, imagem, respeitabilidade).

O assédio moral pode ser classificado em assédio moral descendente, horizontal e ascendente. Se o assédio é praticado pelo superior hierárquico da vítima, trata-se de assédio moral descendente. Se é praticado por colegas de trabalho de mesma posição hierárquica, classifica-se como horizontal. Se proveniente dos subordinados da vítima, tem-se o assédio moral ascendente.

ASSÉDIO SEXUAL QUID PRO QUO E ASSÉDIO SEXUAL AMBIENTAL

O assédio sexual pode ser definido “como toda conduta de natureza sexual não desejada que, embora repelida pelo destinatário, é continuadamente reiterada, cerceando-lhe a liberdade sexual.” (PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Assédio sexual:. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 704, 9 jun. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6826>. Acesso em: 26 maio 2015.)

As espécies de assédio sexual dadas pela doutrina especializada são duas: assédio sexual por chantagem ou quid pro quo, e assédio sexual por intimidação ou ambiental.

O assédio sexual quid pro quo ou por chantagem caracteriza-se quando o superior hierárquico da vítima a constrange com a intenção de obter favores sexuais sob pena de sofrer alguma punição ou perda de benefício no trabalho (demissão, perda de função de confiança, etc). Tal espécie de assédio sexual foi positivada em nosso Código Penal:

"Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função." (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)
Pena - detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)"

Já o assédio sexual por intimidação ou ambiental não pressupõe relação hierárquica, mas que indivíduo, por meio de incitações sexuais indesejadas, crie situação para a vítima ofensiva à sua dignidade moral e sexual, de intimidação ou abuso no ambiente em que é inserida.

O Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região julgou caso pertinente ao tema sob análise:

ASSÉDIO SEXUAL POR CHANTAGEM E POR INTIMIDAÇAO OU AMBIENTAL. Configura-se assédio sexual por chantagem aquele praticado por superior hierárquico consubstanciado na troca de vantagens advindas do vínculo empregatício por favores de cunho sexual. O assédio ambiental ou por intimidação dá-se por uma atuação generalizada violando o direito a um meio ambiente de trabalho sexualmente sadio e concretiza-se por frases ofensivas de cunho sexista, apalpadas, gestos, criando situações humilhantes ou embaraçosas, sempre de cunho libidinoso no ambiente de trabalho. No caso sub oculi, as ações do gerente administrativo e financeiro da reclamada se caracterizam nas duas modalidades acima apontadas. Além de chantagear a obreira condicionando a percepção de aumento salarial e vantagens fornecidas pela empregadora a seus empregados, ao cumprimento de favores de natureza sexual, valendo-se da sua condição de superioridade hierárquica, tornou o ambiente de trabalho envenenado na medida em que não se acanhava em postar-se na porta para se esfregar nas trabalhadoras que ali passassem, fazendo questão de demonstrar sua devassidão perante as colegas de trabalho da obreira, quando as convocava para sua sala e em seu computador passava filmes de conteúdo pornográfico, mediante os quais exibia cenas de sexo explícito e ainda as submetia à humilhação de ter que ouvir "que era para elas aprenderem a fazer direitinho". Ditas condutas produziram constrangimento no ambiente de trabalho da obreira e transtorno em sua vida pessoal, gerando dano moral que deve ser indenizado. (TRT-14 - RO: 1063 RO 0001063, Relator: DESEMBARGADOR ILSON ALVES PEQUENO JUNIOR, Data de Julgamento: 30/11/2011, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DETRT14 n.222, de 01/12/2011)

Para leituras mais aprofundadas, recomendo a leitura dos seguintes artigos:

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Caso prático de aplicação do "tu quoque" no âmbito laboral.

Primeiramente, cabe conceituar o princípio da boa-fé objetiva: é um modelo comportamental, que impõe a todo indivíduo que atue com honestidade, lealdade e probidade em suas relações interpessoais.

Tal princípio se desdobra em quatro institutos: supressio, surrectio, venire contra factum proprium e tu quoque.

O presente artigo visa analisar a aplicação do “tu quoque” no âmbito laboral. (para um estudo dos outros institutos, recomendo o seguinte artigo)

Tu quoque: tal brocardo jurídico “designa a situação de abuso que se verifica quando um sujeito viola uma norma jurídica e, posteriormente, tenta tirar proveito da situação em benefício próprio” (Ronnie Preuss Duarte in Flávio Tartuce, “ Direito Civil ”, Vol. 3, 2009, Ed. Método, pág. 125).

O instituto encontra ressonância nos arts. 476 e 150 do Código Civil.

"Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar indenização."

"Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro."

Imagine o que segue: o município A contratou o servidor B para exercer cargo técnico sem prévia realização de concurso público. Como o vínculo de trabalho é ilegal, é correto afirmar que não são devidas as verbas remuneratórias ao servidor B?

Devido à aplicação do tu quoque, a Administração não pode se beneficiar de seu comportamento ilícito (contratação sem concurso) para negar pagamento da remuneração do servidor. Não é outro o entendimento do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região:

TRT-PR-08-02-2008 BOA-FÉ OBJETIVA - REGRA TU QUOQUE - ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO Viola a regra tu quoque, decorrente da boa-fé objetiva (CCB, art. 422), o Administrador Público que contrata trabalhador sem observância da exigência do art. 37, II, da Constituição da República, e depois lhe nega qualquer direito, pretendendo aproveitar-se do próprio ato ilícito. Não é possível reconhecer, por aplicação da boa-fé objetiva, a existência de contrato de trabalho, sem aprovação em concurso público, pois a boa-fé objetiva deve ser instrumento para viabilizar a aplicação dos princípios constitucionais, e não negá-los. A boa-fé objetiva, contudo, permite a reparação do preJuizo sofrido pelo trabalhador, de haver trabalhado como se empregado fosse, mas sem reconhecimento dessa condição, através do arbitramento de indenização equivalente aos direitos que teria o trabalhador em contrato formal de trabalho. (TRT-9 71200723901 PR 71-2007-23-9-0-1, Relator: EDUARDO MILLÉO BARACAT, 2A. TURMA, Data de Publicação: 08/02/2008)

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Diferença entre Contribuição Confederativa, Contribuição Assistencial e Contribuição Sindical.

CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA

A contribuição confederativa encontra respaldo na Constituição da República:

"CF Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;"

De acordo com a classificação feita por José Afonso da Silva, tal norma classifica-se como norma de eficácia plena, de modo que produz efeitos sem a necessidade de lei ordinária para regular o tema.

Ademais, a contribuição confederativa não poderá ser cobrada de trabalhador não filiado à sindicato:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - RECURSO DE REVISTA - CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA - COBRANÇA COMPULSÓRIA - TRABALHADOR NÃO SINDICALIZADO - IMPOSSIBLIDADE - INCIDÊNCIA DO PRECEDENTE NORMATIVO 119 DA SDC/TST. Verifica-se que o acórdão do eg. Regional encontra-se em harmonia com o precedente normativo nº 119 da SDC do TST. Nesse passo, tem-se que a divergência jurisprudencial suscitada não prospera, ante a previsão do art. 896, § 4º, da CLT, e as violações legais apontadas, por sua vez, encontram óbice na Súmula 333 do TST. Agravo de Instrumento não provido. (TST - AIRR: 8047468120015025555 804746-81.2001.5.02.5555, Relator: José Simpliciano Fontes de F. Fernandes, Data de Julgamento: 08/03/2006, 2ª Turma,, Data de Publicação: DJ 20/04/2006.)

CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL

A contribuição assistencial é aquela imposta para o custeio das atividades essenciais dos sindicatos. O art. 513 da CLT trata do tema:

"Art. 513. São prerrogativas dos sindicatos: e) impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas."

Vale notar que só pode ser cobrada dos trabalhadores sindicalizados:

RECURSO DE REVISTA. CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL PATRONAL. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO PRECEDENTE NORMATIVO 119 E DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 17 DA SDC do TST. São também aplicáveis às empresas, por analogia, o Precedente Normativo 119 e a Orientação Jurisprudencial 17, ambos da SDC do TST, as quais limitam a cobrança de contribuição assistencial apenas aos associados. Recurso de revista conhecido e provido . (TST - RR: 954004320075040007 , Relator: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 10/12/2014, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12/12/2014)

CONTRIBUIÇÃO SINDICAL

Diferentemente da contribuição confederativa e assistencial, a contribuição sindical pode ser cobrada de trabalhador não sindicalizado, uma vez que se trata de tributo. A Carta da República a prevê em seu art. 149:

"CF Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo."

Infraconstitucionalmente, é regulada pela Consolidação das Leis do Trabalho, mais especificamente a partir do art. 578:

"CLT Art. 578 - As contribuições devidas aos Sindicatos pelos que participem das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação do"imposto sindical", pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo. (Vide Decreto-Lei nº 229, de 1967) (Vide Lei nº 11.648, de 2008)"

Além do mais, o STJ tem posicionamento pacificado no sentido da obrigatoriedade dos servidores públicos celetistas ou estatutários, independentemente de filiação, à contribuição sindical compulsória (imposto sindical):

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL COMPULSÓRIA (IMPOSTO SINDICAL). INCIDÊNCIA PARA TODOS OS TRABALHADORES DE DETERMINADA CATEGORIA INDEPENDENTEMENTE DE FILIAÇÃO SINDICAL E DA CONDIÇÃO DE SERVIDOR PÚBLICO CELETISTA OU ESTATUTÁRIO. NÃO INCIDÊNCIA PARA SERVIDORES INATIVOS. 1. O STJ tem posicionamento pacificado no sentido da obrigatoriedade dos servidores públicos celetistas ou estatutários, independentemente de filiação, à contribuição sindical compulsória (imposto sindical). Precedentes: REsp. n. 612.842-RS, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 11.04.05; REsp. n. 728.973/PA, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 10/04/2006; RMS n. 26.254 - MG, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 28.10.2008; RMS n. 30.930 - PR, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Camon, julgado em 01.06.2010; AgRg no RMS n. 36.403-PI, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 14/05/2013; RMS n. 37.228-GO, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 13/08/2013, DJe 20/08/2013. (...) (STJ - RMS: 45441 SP 2014/0092323-3, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 16/04/2015, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/04/2015)

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Direitos Fundamentais e Dignidade da Pessoa Humana.

O artigo de hoje se baseia na seguinte questão:

MPT – 16º Concurso
2) Descreva as funções dos direitos fundamentais, explicitando também a sua articulação com o princípio da dignidade da pessoa humana, indicando, quanto a este, abrangência conceitual, conteúdo, aplicabilidade, dimensões e alcance.

DAS FUNÇÕES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

De acordo com Zulmar Fachin, Gomes Canotilho (Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6. Ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 407-410) menciona as seguintes funções dos direitos fundamentais: função de defesa ou de liberdade; função de prestação social; função de proteção perante terceiros; função de não discriminação.

A função de defesa relaciona-se com os direitos fundamentais de primeira geração, com o dever geral de abstenção do Estado em certas atividades. A título de exemplo, temos o art. 5º, IV da CF: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”

A função de prestação social associa-se à ideia de direito fundamental de segunda geração. Superada a fase negativa do Estado, surge sua fase positiva, em que deve atuar para beneficiar os cidadãos. Temos como exemplo os direitos fundamentais à saúde, à educação, à moradia, ao transporte coletivo etc.

A função de proteção perante terceiros liga-se à Teoria da Repercussão dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas.

Conforme ensinamento de Cristiane Paglione Alves:

"Enquanto a eficácia vertical é a aplicação dos direitos fundamentais nas relações particular-Estado, a eficácia horizontal é a aplicação dos direitos fundamentais às relações entre particulares. Como a relação entre particulares é, ao menos teoricamente, de coordenação, de igualdade jurídica, quando os direitos fundamentais são aplicados a essas relações, se fala que os direitos fundamentais têm uma eficácia horizontal ou privada."

O art. 5º, V da CF exemplifica a referida função: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;”

Já a função de não discriminação tem como principal sustentáculo o seguinte dispositivo constitucional: Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)

É função de todos os direitos fundamentais garantir que o Estado trate seus cidadãos como iguais.


DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Magno Federici Gomes e Frederico Oliveira Freitas elaboraram excelente artigo sobre o assunto.

“Dworkin, ao tratar do conteúdo da dignidade da pessoa humana, acaba reportando-se direta e expressamente à doutrina de Kant, ao relembrar que o ser humano não poderá jamais ser tratado como objeto, isto é, como mero instrumento para realização dos fins alheios, destacando, todavia, que tal postulado não exige que nunca se coloque alguém em situação de desvantagem em prol de outrem, mas sim, que as pessoas nunca poderão ser tratadas de tal forma que se venha a negar a importância distintiva de suas próprias vidas”. (SARLET, Ingo Wolfgang. As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma compreensão jurídico-constitucional necessária e possível. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional, 2. ed. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2009, p. 36, citando a DWORKIN, Ronald. El domínio de la vida: una discusión acerca del aborto, la eutanasia y la liberdad individual. Barcelona: Ariel, 1998, p. 307-310.)

Flórez Valdés afirma que a dignidade da pessoa humana possui certos aspectos notáveis:

a) igualdade de direitos entre os homens, uma vez integrarem a sociedade como pessoas e não como cidadãos; b) garantia de independência e autonomia do ser humano, de forma a obstar toda coação externa ao desenvolvimento de sua personalidade, bem como toda atuação que implique na sua degradação; c) não admissibilidade da negativa dos meios fundamentais para o desenvolvimento de alguém como pessoa ou a imposição de condições subumanas de vida” (FLÓREZ VALDÉS, Joaquín Arce y. Los principios generales del derecho y su formulación constitucional. Madri: Editora Civitas, 1990, p. 149.).

Na preleção de José Afonso da Silva (2007) “a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida” (SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à constituição – ob. cit., 2007, p. 38.).

Como se pode observar, a maior função dos direitos fundamentais é justamente assegurar a dignidade da pessoa humana. As quatro funções anteriormente citadas nada mais são do que a garantia de que o indivíduo não será tratado como um mero objeto a fim de satisfazer interesses mesquinhos de outrem.

Ademais, como demonstrou Nadya Regina Gusella Tonial, a dignidade da pessoa humana pode ser abordada sob suas diversas dimensões: ontológica, intersubjetiva e histórico-cultural.

Na dimensão ontológica, a dignidade entende-se como atributo inato ao ser humano. Se toda pessoa tem capacidade de raciocinar, pode também autodeterminar-se: os seres humanos devem ter autonomia para pautar suas ações.

Quanto à dimensão intersubjetiva, pode-se afirmar que é traduzida em uma variedade de deveres e direitos que existem a fim de garantir o bem estar coletivo.

Já a faceta histórico-cultural da dignidade mostra que esta não é estática no tempo, mas tem seu conceito modificado pelas diferentes gerações e culturas.

Além disso, a dignidade pode ser vista simultaneamente como limite e como tarefa. Limite porque os indivíduos e o Estado não poderão intervir de modo a ferir a dignidade da pessoa humana. Tarefa pois deverão agir de modo a garanti-la.

Obs: A prova e o gabarito da 2º fase do 16º Concurso do MPT podem ser vistos nos seguintes links: L1 , L2.

sábado, 16 de maio de 2015

Você já ouviu falar em guelta? De acordo com o TST, ela tem natureza salarial!

De acordo com Aparecida Tokumi Hashimoto, "é o valor pago habitualmente a empregados, a título de incentivo, por conta de terceiros, mas em decorrência de contrato de trabalho mantido com seus empregadores, a guelta é um importante instrumento do marketing de incentivo, praticado no incremento de vendas de determinados produtos, como os das vendas de eletrodomésticos e medicamentos. No setor de eletrodomésticos, os fabricantes pagam gueltas aos vendedores das lojas para incentivá-los a vender seus produtos à clientela de seus empregadores."

Sendo a gorjeta o valor pago a um funcionário pelo bom serviço prestado, é possível equiparar a guelta à gorjeta? 

A natureza jurídica de gorjeta da guelta é pacífica no Tribunal Superior do Trabalho:

"TST - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA AIRR 21745820115180005 2174-58.2011.5.18.0005 (TST)
Data de publicação: 14/11/2013
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - PARCELA -OVER- - GUELTA - VERBA PAGA POR TERCEIRO DECORRENTE DAS ATIVIDADES DESEMPENHADAS PELO EMPREGADO - NATUREZA JURÍDICA - GORJETA - INTEGRAÇÃO AO SALÁRIO. Tem natureza jurídica de gorjeta a parcela -over- (guelta) paga por terceiros e que decorre da venda de produtos pela reclamante no exercício de suas atividades junto ao empregador. Logo, as gueltas compõem a remuneração da reclamante e possuem a mesma natureza integrativa atribuída às gorjetas, uma vez que pagas por terceiros a título de incentivo ao empregado. Incide, por analogia, o entendimento preconizado na Súmula nº 354 do TST. Agravo de instrumento desprovido."

Como a guelta tem natureza jurídica de gorjeta, segue as mesmas regras desta. Portanto, aplica-se a súmula 354 do TST:

"TST Súmula Nº 354 GORJETAS. NATUREZA JURÍDICA. REPERCUSSÕES - Revisão da Súmula nº 290 - Res. 23/1988, DJ 24.03.1988
As gorjetas, cobradas pelo empregador na nota de serviço ou oferecidas espontaneamente pelos clientes, integram a remuneração do empregado, não servindo de base de cálculo para as parcelas de aviso-prévio, adicional noturno, horas extras e repouso semanal remunerado."

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Direito Processual do Trabalho: Breve Análise do Agravo de Instrumento.


O presente artigo tem por objetivo analisar item por item do art. 897 da CLT no que tange ao agravo de instrumento:

"CLT Art. 897 - Cabe agravo, no prazo de 8 (oito) dias: (Redação dada pela Lei nº 8.432, de 1992)


b) de instrumento, dos despachos que denegarem a interposição de recursos. (Redação dada pela Lei nº 8.432, de 1992)"


O agravo de instrumento no direito processual trabalhista só tem cabimento quando houver despacho denegatório de recurso.

Logo, confirma-se o art. 893 § 1º da CLT: "Os incidentes do processo são resolvidos pelo próprio Juízo ou Tribunal, admitindo-se a apreciação do merecimento das decisões interlocutórias somente em recursos da decisão definitiva."

Ou seja, no processo do trabalho vigora o princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias. Porém, admite-se que certas decisões interlocutórias sejam impugnadas através de mandado de segurança, ação prevista constitucionalmente, como no caso de antecipação de tutela concedida antes da sentença (súmula 414 do TST).


"§ 2º - O agravo de instrumento interposto contra o despacho que não receber agravo de petição não suspende a execução da sentença. (Redação dada pela Lei nº 8.432, de 1992)"


Via de regra o agravo de instrumento não terá efeito suspensivo. Porém, parte da jurisprudência admite a concessão de efeito suspensivo se manejada ação cautelar para esse fim:


MEDIDA CAUTELAR. ATRIBUIÇAO DE EFEITO SUSPENSIVO A AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE FUMUS BONI JURIS. IMPROCEDÊNCIA. O art. 899 da Consolidação das Leis do Trabalho é claro ao prever o efeito meramente devolutivo aos recursos no processo trabalhista, característica que é mais acentuada quando se trata de Agravo de Instrumento. Somente se pode cogitar de efeito suspensivo, com fulcro no poder geral de cautela atribuído ao julgador pelo art. 798 do Código de Processo Civil, em casos excepcionalíssimos e se restar comprovada de forma inequívoca a presença concomitante dos requisitos necessários a sua concessão (fumus boni juris e periculum in mora). Não sendo este o caso em apreço, impossível o acolhimento da pretensão do requerente, no sentido de ver paralisado o procedimento de execução já encetado em primeira instância. Medida Cautelar que se julga improcedente. (TRT-13 - AC: 106386 PB 00043.2009.000.13.00-0, Relator: UBIRATAN MOREIRA DELGADO, Data de Julgamento: 06/05/2009, Segunda Turma, Data de Publicação: 16/06/2009)



"§ 4º - Na hipótese da alínea b deste artigo, o agravo será julgado pelo Tribunal que seria competente para conhecer o recurso cuja interposição foi denegada. (Incluído pela Lei nº 8.432, de 1992)"


A dúvida é se o agravo de instrumento deve ser interposto perante o juiz a quo ou ad quem. Eis dispositivos relevantes da Instrução Normativa 16 do TST, que uniformiza a interpretação da Lei nº 9.756, de 17 de dezembro de 1998, com relação a agravo de instrumento:


"IV - O agravo de instrumento, protocolizado e autuado, será concluso ao juiz prolator do despacho agravado, para reforma ou confirmação da decisão impugnada, observada a competência estabelecida nos arts. 659, inciso VI, e 682, inciso IX, da CLT.

V - Será certificada nos autos principais a interposição do agravo de instrumento e a decisão que determina o seu processamento ou a decisão que reconsidera o despacho agravado.

VI - Mantida a decisão agravada, será intimado o agravado a apresentar contra-razões relativas ao agravo e, simultaneamente, ao recurso principal, juntando as peças que entender necessárias para o julgamento de ambos, encaminhando-se, após, os autos do agravo ao Juízo competente."


Portanto, o agravo de instrumento será interposto no juízo originário, sob pena de não ser conhecido:


AGRAVO DE INSTRUMENTO DE DECISÃO DENEGATÓRIA DE RECURSO ORDINÁRIO. INTERPOSIÇÃO PERANTE O TRIBUNAL REGIONAL. Interposto o agravo de instrumento de decisão denegatória do recurso ordinário diretamente perante a Corte Revisora, não há de ser conhecido o agravo. Inteligência dos arts. 659, VI, e 897, §§ 5º e 6º, da CLT c/c Instrução Normativa nº 16 do TST). Agravo de Instrumento não conhecido. I - (TRT-10 - AIRO: 1032201200010000 DF 01032-2012-000-10-00-0 AIRO, Relator: Juiz Paulo Henrique Blair , Data de Julgamento: 21/11/2012, 3ª Turma, Data de Publicação: 30/11/2012 no DEJT)



§ 5o Sob pena de não conhecimento, as partes promoverão a formação do instrumento do agravo de modo a possibilitar, caso provido, o imediato julgamento do recurso denegado, instruindo a petição de interposição: (Incluído pela Lei nº 9.756, de 1998)


Por que a formação do instrumento? Por que não enviar o processo originário diretamente ao Tribunal para a análise de sua admissibilidade?

Porque o agravo de instrumento não possui efeito suspensivo. A execução da sentença poderá ser iniciada no juízo originário, ainda que a título provisório, de modo que haverá dois processos em tramitação: um no juiz a quo (fase de execução da sentença) e um no juiz ad quem (a fim de julgar o agravo de instrumento).


"I - obrigatoriamente, com cópias da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação, das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado, da petição inicial, da contestação, da decisão originária, do depósito recursal referente ao recurso que se pretende destrancar, da comprovação do recolhimento das custas e do depósito recursal a que se refere o § 7o do art. 899 desta Consolidação; (Redação dada pela Lei nº 12.275, de 2010)"


A exigência de tais peças se justifica porque se o agravo for provido a Turma deliberará sobre o julgamento do recurso principal, designando, se for o caso, relator e revisor. Diferentemente do processo civil, em que as peças necessárias são em menor número.

Vale notar o art. 899 da CLT:


"§ 7o No ato de interposição do agravo de instrumento, o depósito recursal corresponderá a 50% (cinquenta por cento) do valor do depósito do recurso ao qual se pretende destrancar. (Incluído pela Lei nº 12.275, de 2010)

§ 8o Quando o agravo de instrumento tem a finalidade de destrancar recurso de revista que se insurge contra decisão que contraria a jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho, consubstanciada nas suas súmulas ou em orientação jurisprudencial, não haverá obrigatoriedade de se efetuar o depósito referido no § 7o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.015, de 2014)"


A exigência do depósito recursal para a impetração do agravo de instrumento tem o objetivo de evitar recursos protelatórios.

Como destaca Mauro Schiavi, “trata-se de providência salutar a desencorajar Agravos de Instrumento protelatórios, ou sem fundamento, bem como reforçar a garantia de execução por quantia, pois o Agravo provoca delonga na marcha processual”. (Manual de Direito Processual do Trabalho, 6ª. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 814).

Conforme notícia publicada pelo portal de notícias CONJUR, “somente no ano de 2009, foram interpostos 142.650 Agravos de Instrumento no TST, e apenas 5% foram acolhidos.” 


"II - facultativamente, com outras peças que o agravante reputar úteis ao deslinde da matéria de mérito controvertida .(Incluído pela Lei nº 9.756, de 1998)"



"§ 6o O agravado será intimado para oferecer resposta ao agravo e ao recurso principal, instruindo-a com as peças que considerar necessárias ao julgamento de ambos os recursos. (Incluído pela Lei nº 9.756, de 1998)"


Veja a agilidade: o agravado, além de responder ao agravo, responderá também ao recurso principal, uma vez que se o agravo for provido a Turma terá condições imediatas de designar relator e revisor, se for o caso, para dar início ao procedimento relativo ao julgamento do recurso principal.


"§ 7o Provido o agravo, a Turma deliberará sobre o julgamento do recurso principal, observando-se, se for o caso, daí em diante, o procedimento relativo a esse recurso. (Incluído pela Lei nº 9.756, de 1998)"

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Regras para a participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional.

O presente artigo tem por objetivo analisar item por item o art. 476-A da CLT e seus parágrafos, bem como parcela da Lei 7.998/90:

CLT Art. 476-A. O contrato de trabalho poderá ser suspenso, por um período de dois a cinco meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, com duração equivalente à suspensão contratual, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado, observado o disposto no art. 471 desta Consolidação. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

São três os requisitos da participação em curso ou programa de qualificação profissional: a) previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho; b) consentimento formal do empregado (por escrito); c) duração de dois a cinco meses do curso ou programa.

É efeito da participação: a) suspensão do contrato do trabalho: não haverá recebimento de salário, bem como não haverá cômputado de tempo de serviço

Ressalte-se que no caso aplica-se o art. 471 da CLT: “Ao empregado afastado do emprego, são asseguradas, por ocasião de sua volta, todas as vantagens que, em sua ausência, tenham sido atribuídas à categoria a que pertencia na empresa.” Ou seja, se houver aumento da remuneração, vigência de novo acordo ou convenção coletiva em que há a concessão de novos benefícios para o empregado, etc, todas estas vantagens serão asseguradas ao afastado.

§ 1º Após a autorização concedida por intermédio de convenção ou acordo coletivo, o empregador deverá notificar o respectivo sindicato, com antecedência mínima de quinze dias da suspensão contratual. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

Caso não haja a notificação do sindicato no prazo mínimo de 15 dias da suspensão contratual, caberá multa a ser aplicada pela fiscalização do trabalho, conforme art. 510 da CLT: “Pela infração das proibições constantes deste Título, será imposta à empresa a multa de valor igual a 1 (um) salário mínimo regional, elevada ao dobro, no caso de reincidência, sem prejuízo das demais cominações legais “

A notificação do sindicato tem o desiderato de que haja mais um ente a fiscalizar a aplicação da lei trabalhista.

§ 2º O contrato de trabalho não poderá ser suspenso em conformidade com o disposto no caput deste artigo mais de uma vez no período de dezesseis meses. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

O parágrafo segundo traz outro requisito à participação de programa ou curso de qualificação profissional.

§ 3º O empregador poderá conceder ao empregado ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, durante o período de suspensão contratual nos termos do caput deste artigo, com valor a ser definido em convenção ou acordo coletivo.

Frise-se que a referida ajuda é opcional. Ademais, não terá natureza salarial, de modo que não incindirá sobre ela o respectivo depósito do FGTS, contribuição previdenciária, etc.

Se o empregador desejar oferecer a ajuda financeira, o valor não é discricionário, deverá observar o disposto no contrato coletivo.

§ 4º Durante o período de suspensão contratual para participação em curso ou programa de qualificação profissional, o empregado fará jus aos benefícios voluntariamente concedidos pelo empregador.(Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

Vide art. 471 da CLT.

§ 5º Se ocorrer a dispensa do empregado no transcurso do período de suspensão contratual ou nos três meses subseqüentes ao seu retorno ao trabalho, o empregador pagará ao empregado, além das parcelas indenizatórias previstas na legislação em vigor, multa a ser estabelecida em convenção ou acordo coletivo, sendo de, no mínimo, cem por cento sobre o valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

Tal penalidade se justifica para que não ocorra o desvirtuamento de instituto. Como se verá adiante, a LEI Nº 7.998, DE 11 DE JANEIRO DE 1990 institui bolsa de qualificação profissional a ser custeada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador. Se não houvesse a limitação do parágrafo acima, o empregador, sempre antes de dispensar um empregado ineficiente, por exemplo, poderia permitir que este participasse de curso ou programa de qualificação profissional, para só então rescindir seu contrato de trabalho. Deste modo o empregado poderia ser beneficiado com bolsa de qualificação profissional, além do seguro desemprego posterior.

§ 6º Se durante a suspensão do contrato não for ministrado o curso ou programa de qualificação profissional, ou o empregado permanecer trabalhando para o empregador, ficará descaracterizada a suspensão, sujeitando o empregador ao pagamento imediato dos salários e dos encargos sociais referentes ao período, às penalidades cabíveis previstas na legislação em vigor, bem como às sanções previstas em convenção ou acordo coletivo. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

A sanção se dá pois retira do empregado a possibilidade de participação de outro programa ou curso de qualificação profissional nos próximos 16 meses, conforme § 2º. Outrossim, pode haver hipótese de fraude, se o empregado estiver recebendo bolsa de qualificação profissional custeada pelo FAT sem a corresponde participação no curso ou programa.

§ 7º O prazo limite fixado no caput poderá ser prorrogado mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado, desde que o empregador arque com o ônus correspondente ao valor da bolsa de qualificação profissional, no respectivo período. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

Ou seja, não poderá haver prorrogação sem que o empregador arque com a bolsa de qualificação profissional do empregado. Este não poderá utilizar-se da bolsa da Lei 7.998 no período adicional.


Art. 2º O programa do seguro-desemprego tem por finalidade:

II - auxiliar os trabalhadores na busca ou preservação do emprego, promovendo, para tanto, ações integradas de orientação, recolocação e qualificação profissional.

O fornecimento de bolsa de qualificação profissional também evita o desemprego ao capacitar o trabalhador para exercer funções mais complexas no mercado de trabalho.

Art. 2º-A. Para efeito do disposto no inciso II do art. 2o, fica instituída a bolsa de qualificação profissional, a ser custeada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT, à qual fará jus o trabalhador que estiver com o contrato de trabalho suspenso em virtude de participação em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, em conformidade com o disposto em convenção ou acordo coletivo celebrado para este fim. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

O programa ou curso de qualificação profissional que alude o dispositivo legal é o disposto no art. 476-A da CLT.

Art. 3º-A. A periodicidade, os valores, o cálculo do número de parcelas e os demais procedimentos operacionais de pagamento da bolsa de qualificação profissional, nos termos do art. 2º-A desta Lei, bem como os pré-requisitos para habilitação serão os mesmos adotados em relação ao benefício do Seguro-Desemprego, exceto quanto à dispensa sem justa causa. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

sábado, 9 de maio de 2015

Você sabia? Hoje já há hipóteses de terceirização da atividade-fim consideradas lícitas.

1 CONTRATO DE SUBEMPREITADA

O Código Civil regula o contrato de empreitada a partir de seu art. 610. Pode ser entendido como um contrato em que há obrigação de resultado. Uma ou mais pessoas se comprometem a entregar determinada obra especificada, mediante remuneração e sem subordinação.

A Consolidação das Leis do Trabalho permite a terceirização da empreitada, através da subempreitada, em que o empreiteiro contrata outra pessoa física ou jurídica para realizar determinada parte da obra.

O art. 455 da CLT define a responsabilidade do empreiteiro em relação aos débitos trabalhistas do subempreiteiro:

"CLT Art. 455 - Nos contratos de subempreitada responderá o subempreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados, o direito de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas obrigações por parte do primeiro.

Parágrafo único - Ao empreiteiro principal fica ressalvada, nos termos da lei civil, ação regressiva contra o subempreiteiro e a retenção de importâncias a este devidas, para a garantia das obrigações previstas neste artigo."

Há divergência se a responsabilidade é subsidiária ou solidária.

O entendimento dominante no TST é o da responsabilidade solidária entre empreiteira e subempreiteira:

RECURSO DE REVISTA. ADMISSIBILIDADE. CONTRATO DE SUBEMPREITADA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA EMPREITEIRA PRINCIPAL. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que o artigo 455 da CLT atribui responsabilidade solidária entre empreiteiro e sub-empreiteiro no caso de inadimplemento dos direitos devidos ao trabalhador. Precedentes. Recurso de revista não conhecido .(TST - RR: 8557920135030077 , Relator: Emmanoel Pereira, Data de Julgamento: 04/02/2015, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 20/02/2015)

2 CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO

A Lei nº 6.019, DE 3 DE JANEIRO DE 1974 dispõe sobre o Trabalho Temporário nas Empresas Urbanas, e dá outras Providências.

O trabalho temporário caracteriza-se quando há cessão de empregados por uma empresa de trabalho temporário para determinada empresa comum devido à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou ao acréscimo extraordinário de serviços.

A empresa de trabalho temporário pode compreender pessoa física ou jurídica urbana, que tem como atividade colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores por ela remunerados e assistidos.

O contrato de trabalho temporário só poderá ser realizado por escrito, de modo a constar expressamente o motivo justificador da demanda de trabalho temporário, assim como as modalidades de remuneração e prestação de serviço.

Ademais, o contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora ou cliente, com relação a um mesmo empregado, não poderá exceder de três meses, salvo autorização conferida pelo órgão local do Ministério do Trabalho.

Por fim, é vedada a contratação de estrangeiros com visto provisório de permanência no País por empresa de trabalho temporário.

3 SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES

Aparentemente, a Lei nº 9.472, DE 16 DE JULHO DE 1997 admite a terceirização da atividade-fim para as concessionárias de serviço público de telecomunicações:

"Art. 94. No cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela Agência:

II - contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos associados."

Porém, neste caso em específico, o TST afasta tal interpretação, por considerá-la inconstitucional, devido ao fato de que não há que se falar em superioridade do princípio da livre iniciativa sobre o princípio do valor social do trabalho:

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA CONTAX S.A. - 1. RITO SUMARÍSSIMO - VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. Nos termos do artigo 896, § 6º, da CLT, somente se admite recurso de revista em procedimento sumaríssimo por violação direta de preceito da Constituição Federal e/ou contrariedade a súmula deste Tribunal Superior do Trabalho, razão porque o recurso não se viabiliza pela alegada violação do art. 16 da Lei nº 7.347/85. 2. EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS DE TELEFONIA - TERCEIRIZAÇÃO - CALL CENTER - IMPOSSIBILIDADE. A Constituição Federal, viga-mestra do Estado Democrático de Direto implantado na República Federativa do Brasil desde 1988, prevê, tanto em seu artigo 1º, IV (que versa sobre os fundamentos da República) quanto no artigo 170, caput (que elenca os princípios gerais da atividade econômica), a coexistência principiológica do valor social do trabalho com a livre iniciativa, não sendo de forma alguma possível cogitar-se de prevalência de uma sobre a outra. Fixada essa premissa, impõe-se a origem histórica da controvérsia em razão de questões econômicas ideológicas predominantes no poder Executivo Federal, em 1995 foi promulgada a Emenda Constitucional nº 8, que possibilitaria a privatização das telecomunicações no Brasil, ao alterar o artigo 21, XI, da Constituição Federal de 1988 e prever a exploração daqueles serviços por meio de autorização, concessão ou permissão, nos termos da lei que disporia sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais". Pois bem, a lei mencionada pela Emenda Constitucional nº 8 veio a ser editada em 1997 (Lei nº 9.472/97), e, em seu artigo 94, estipula que "no cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela Agência, (...) contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos associados", que "em qualquer caso, a concessionária continuará sempre responsável perante a Agência e os usuários". Ora, a possibilidade prevista pelo dispositivo mencionado de "contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço" não corresponde à autorização legislativa para a terceirização da atividade-fim das empresas prestadoras do serviço de telefonia. Afinal, é importante considerar que tanto a Lei em exame quanto a própria Emenda Constitucional nº 8/1995 em nada alteraram os artigos 1º, IV, e 170, caput , da Constituição Federal nem poderiam, por força do artigo 60, § 4º, da própria Constituição Federal, combinado com o entendimento do excelso STF acerca da abrangência das chamadas cláusulas pétreas da Carta Magna (v. g., STF-ADPF-33-MC, voto do Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 29/10/2003, Plenário, DJU de 6/8/2004). Acrescente-se que a interpretação do artigo 94 da Lei nº 9.472/97 que leve à conclusão de que há nele autorização para a terceirização da atividade-fim das empresas prestadoras de serviço corresponde não apenas a uma inconstitucional superioridade da livre iniciativa sobre o valor social do trabalho como também à prevalência até mesmo das relações de consumo sobre este - quando é certo que a Constituição Federal adotou um eloquente silêncio acerca de tais relações nos principiológicos artigos 1º, IV, e 170, caput . Com efeito, o próprio legislador ordinário estabeleceu, no § 1º do artigo 94, que, para os usuários, a eventual contratação de terceiros na forma do inciso II não gera efeito algum, pois a empresa prestadora de serviços permanece sempre responsável; não há como negar, portanto, essa mesma responsabilidade perante os trabalhadores, senão tornando-a inferior à relação de consumo. Por fim, é entendimento deste e. Tribunal de que não é lícita a terceirização dos serviços de call center pelas empresas operadoras de telefonia, por se tratar de atividade-fim dessas. Precedentes. Agravo de instrumento não provido. (...) (TST - ARR: 10221420105030009 1022-14.2010.5.03.0009, Relator: Maria das Graças Silvany Dourado Laranjeira, Data de Julgamento: 15/05/2013, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/05/2013)

O que é o depósito recursal trabalhista? Quais os efeitos da concessão da justiça gratuita sobre o depósito recursal?

O depósito recursal está previsto no art. 899 da CLT:


"Art. 899 - Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções previstas neste Título, permitida a execução provisória até a penhora. (Redação dada pela Lei nº 5.442, de 24.5.1968) (Vide Lei nº 7.701, de 1988)

§ 1º Sendo a condenação de valor até 10 (dez) vêzes o salário-mínimo regional, nos dissídios individuais, só será admitido o recurso inclusive o extraordinário, mediante prévio depósito da respectiva importância. Transitada em julgado a decisão recorrida, ordenar-se-á o levantamento imediato da importância de depósito, em favor da parte vencedora, por simples despacho do juiz. (Redação dada pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 2º Tratando-se de condenação de valor indeterminado, o depósito corresponderá ao que fôr arbitrado, para efeito de custas, pela Junta ou Juízo de Direito, até o limite de 10 (dez) vêzes o salário-mínimo da região. (Redação dada pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 4º - O depósito de que trata o § 1º far-se-á na conta vinculada do empregado a que se refere o art. 2º da Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, aplicando-se-lhe os preceitos dessa Lei observado, quanto ao respectivo levantamento, o disposto no § 1º. (Redação dada pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 5º - Se o empregado ainda não tiver conta vinculada aberta em seu nome, nos termos do art. 2º da Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, a empresa procederá à respectiva abertura, para efeito do disposto no § 2º. (Redação dada pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 6º - Quando o valor da condenação, ou o arbitrado para fins de custas, exceder o limite de 10 (dez) vêzes o salário-mínimo da região, o depósito para fins de recursos será limitado a êste valor. (Incluído pela Lei nº 5.442, 24.5.1968)

§ 7o No ato de interposição do agravo de instrumento, o depósito recursal corresponderá a 50% (cinquenta por cento) do valor do depósito do recurso ao qual se pretende destrancar. (Incluído pela Lei nº 12.275, de 2010)

§ 8o Quando o agravo de instrumento tem a finalidade de destrancar recurso de revista que se insurge contra decisão que contraria a jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho, consubstanciada nas suas súmulas ou em orientação jurisprudencial, não haverá obrigatoriedade de se efetuar o depósito referido no § 7o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.015, de 2014)"


Primeiramente, deve-se notar que é privilégio da fazenda pública a dispensa de depósito para interposição de recurso, conforme art. 1º, IV do DECRETO-LEI No 779, DE 21 DE AGOSTO DE 1969.

Veja que o parágrafo quarto do art. 899 afirma que o depósito far-se-á na conta vinculada do trabalhador: é a mesma conta em que são feitos os depósitos do FGTS. A interpretação, portanto, é que não há que se falar em depósito recursal feito por parte do empregado. O objetivo do dispositivo legal é garantir o cumprimento da condenação imposta ao empregador, de modo que após o trânsito em julgado da decisão, o depósito será imediatamente levantado pelo empregado:

EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO RECURSAL POR PARTE DO RECLAMANTE. IMPOSSIBILIDADE - O depósito recursal não tem natureza jurídica de taxa de recurso, mas de garantia do juízo recursal (Instrução Normativa nº 03/93 do TST), ou seja, objetiva garantir o cumprimento da condenação. A medida é voltada exclusivamente para atender o interesse do trabalhador que, embora tendo de aguardar o julgamento do recurso interposto, terá a certeza de que ao menos parte do valor da condenação imposta encontra-se reservado para a execução da sentença.Ademais, embora o -caput- do art. 899 da CLT não declare expressamente que o depósito recursal é exigido apenas do recorrente empregador, tal conclusão é facilmente extraída dos parágrafos §§ 4º e 5º do mencionado dispositivo legal, quando estabelecem que o depósito far-se-á na conta vinculada do trabalhador, que deverá ser aberta em seu nome, se ainda não a tiver.Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 6330058220005105555 633005-82.2000.5.10.5555, Relator: Rider de Brito, Data de Julgamento: 17/12/2003, 5ª Turma,, Data de Publicação: DJ 26/03/2004.)

Posteriormente, a Lei 8.177/91 mudou a sistemática relativa aos depósitos recursais; modificou o critério do salário-mínimo regional para um valor fixo a ser atualizado por índices de atualização monetária:


Art. 40. O depósito recursal de que trata o art. 899 da Consolidação das Leis do Trabalho fica limitado a Cr$ 20.000.000,00 (vinte milhões de cruzeiros), nos casos de interposição de recurso ordinário, e de Cr$ 40.000.000,00 (quarenta milhões de cruzeiros), em se tratando de recurso de revista, embargos infringentes e recursos extraordinários, sendo devido a cada novo recurso interposto no decorrer do processo. (Redação dada pela Lei nº 8.542, de 1992).

§ 1° Em se tratando de condenação imposta em ação rescisória, o depósito recursal terá, como limite máximo, qualquer que seja o recurso, o valor de Cr$ 40.000.000,00 (quarenta milhões de cruzeiros). (Redação dada pela Lei nº 8.542, de 1992).

§ 2° A exigência de depósito aplica-se, igualmente, aos embargos, à execução e a qualquer recurso subseqüente do devedor. (Redação dada pela Lei nº 8.542, de 1992).

§ 3° O valor do recurso ordinário, quando interposto em dissídio coletivo, será equivalente ao quádruplo do previsto no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 8.542, de 1992).

§ 4° Os valores previstos neste artigo serão reajustados bimestralmente pela variação acumulada do INPC do IBGE dos dois meses imediatamente anteriores. (Incluído pela Lei nº 8.542, de 1992).


O TST regularmente procede à atualização dos valores, como pode-se observar em seu sítio eletrônico.

Surge uma grande dúvida: a concessão do benefício da justiça gratuita importa na desnecessidade de efetuar o depósito recursal para a interposição de recurso trabalhista?

Segue transcrição do art. 3º da lei 1.060/50, a qual estabelece normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados.:


Art. 3º. A assistência judiciária compreende as seguintes isenções: (Vide Lei n º 13.105, de 2015) (Vigência)

I - das taxas judiciárias e dos selos;

II - dos emolumentos e custas devidos aos Juízes, órgãos do Ministério Público e serventuários da justiça;

III - das despesas com as publicações indispensáveis no jornal encarregado da divulgação dos atos oficiais;

IV - das indenizações devidas às testemunhas que, quando empregados, receberão do empregador salário integral, como se em serviço estivessem, ressalvado o direito regressivo contra o poder público federal, no Distrito Federal e nos Territórios; ou contra o poder público estadual, nos Estados;

V - dos honorários de advogado e peritos.

VI – das despesas com a realização do exame de código genético – DNA que for requisitado pela autoridade judiciária nas ações de investigação de paternidade ou maternidade. (Incluído pela Lei nº 10.317, de 2001)

VII – dos depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).


Veja que o inciso VII aparentemente responde a questão. O beneficiado pela justiça gratuita também está isento de efetuar o depósito recursal trabalhista:

JUSTIÇA GRATUITA. AMPLITUDE. AUSÊNCIA DE DEPÓSITO RECURSAL. DESERÇÃO NÃO CARACTERIZADA. A atual redação do inciso VII ao art. 3º da Lei nº 1.060/50 dispõe que a assistência judiciária gratuita concedida compreende a isenção "dos depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório". (TRT-5 - RecOrd: 00006238720135050020 BA 0000623-87.2013.5.05.0020, Relator: RENATO MÁRIO BORGES SIMÕES, 2ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 24/10/2014.)

Porém, mesmo com a clareza do dispositivo legal, o TST, de forma surpreendente, manteve o entendimento anterior à Lei Complementar nº 132/2009, no que tange à necessidade do depósito recursal. O argumento pode ser observado a seguir:

PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. NÃO ABRANGÊNCIA DO DEPÓSITO RECURSAL. NÃO APLICAÇÃO DO TEOR DO ART. 3º, INCISO VII, DA LEI Nº 1.060/50, COM ALTERAÇÃO DA LC Nº 132/2009, AO PROCESSO DO TRABALHO. A concessão de assistência judiciária gratuita, no âmbito do processo do trabalho, não implica a dispensa de que seja efetuado o depósito recursal, dada a sua natureza de garantia do juízo da execução. Nesse sentido é o entendimento prevalecente desta Corte. Esclareça-se, por oportuno, que não se aplica o disposto no inciso VII do art. 3º da Lei nº 1.060/50, com a alteração dada pelaLei Complementar nº 132/2009, ao processo trabalhista. O preceptivo assim dispõe: "Art. 3º. A assistência judiciária compreende as seguintes isenções VII - dos depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório". A alteração implementada no art. 3º da Lei nº 1.060/50, que conferiu nova redação ao seu inciso VII como citado, decorreu da Lei Complementar nº 132, de 2009, cujo principal objetivo foi alterar os dispositivos da Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994, que se refere, essencialmente, à organização da Defensoria Pública. Tem-se que os preceitos constantes da referida Lei nº 1.060/50, incluindo-se a redação do inciso VII do seu art. 3º conferida mediante Lei Complementar, ainda que de hierarquia superior, somente têm aplicação ao processo do trabalho quando houver omissão na legislação trabalhista e, ainda assim, apenas naquilo em que com ele for compatível. Esse é o princípio norteador da incidência ou não dos preceitos constantes de diplomas legais inseridos no ordenamento jurídico civil de forma subsidiária à sistemática trabalhista, nos exatos termos do art. 769 da CLT. E é exatamente sob essa ótica que se impõe concluir pela impossibilidade de aplicação do teor do art. 3º, inciso VII, da Lei nº 1.060/50, com a redação conferida pela Lei Complementar nº 132 de 2009, ao processo do trabalho relativamente ao depósito recursal, visto que, nesta esfera, tal depósito constitui garantia do juízo da execução, que, ao final de demanda, poderá ser levantado de imediato pelo autor da ação caso vencedor, não se identificando, portanto, com aqueles "depósitos previstos em lei para interposição de recurso" de que trata a lei. Recurso de revista não conhecido . (...) (TST - RR: 11390820125060411 , Relator: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 25/03/2015, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/03/2015)

Me parece que a decisão do Colendo Tribunal Superior do Trabalho é absurda, sem nexo algum. O argumento é fraquíssimo, desprovido de lógica. Ao meu ver, foi mais uma tentativa desesperada de manter um benefício para os trabalhadores, ao total arrepio da lei. 

O desiderato do dispositivo legal foi maximizar a força normativa da Constituição, ao garantir o contraditório e ampla defesa para os necessitados.

Infelizmente, há variados casos em que o TST atua como legislador, de modo a não observar a lei. Outro exemplo seria a súmula 353, que será analisada em outro artigo. 

Por fim, a dúvida é se o STF conheceria de eventual recurso extraordinário interposto da decisão acima exposta, sob o argumento da violação do art. 5º, LXXIV da Constituição Federal. Aguardemos!

quarta-feira, 6 de maio de 2015

As lacunas no Direito. O que são as lacunas normativas, axiológicas e ontológicas? Veja alguns exemplos práticos de lacunas no Direito e Processo do Trabalho.

A doutrina costuma classificar as lacunas da legislação em três tipos principais: lacuna normativa, axiológica e ontológica.

Na lacuna normativa há ausência de lei para o caso concreto. A título de exemplo, podemos citar a terceirização trabalhista. Na falta de norma legal, o TST editou a súmula 331 para suprir a lacuna existente, que regula o instituto em nosso ordenamento jurídico.

No caso, o Colendo Tribunal Superior aplicou o art. 8º da CLT:

"Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público."

Na lacuna axiológica há lei para o caso concreto, porém sua aplicação se revela injusta ou insatisfatória. É o caso do duplo grau de jurisdição obrigatório no processo do trabalho. Eis o art. Art. 1º, V do Decreto-Lei nº 779: 

“Nos processos perante a Justiça do Trabalho, constituem privilégio da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das autarquias ou fundações de direito público federais, estaduais ou municipais que não explorem atividade econômica: o recurso ordinário "ex officio" das decisões que lhe sejam total ou parcialmente contrárias;”

Veja que há lei expressa que disciplina o duplo grau de jurisdição obrigatório em sede de direito processual trabalhista. Não há lacuna normativa. Porém, poder-se-ia argumentar que há lacuna axiológica, pois conceder à Fazenda Pública tal privilégio sem restrições teria resultado insatisfatório, pois o número de ações que seriam levadas aos Tribunais Trabalhistas seria enorme, de modo a tornar inviável a prestação jurisdicional.

Tendo isso em vista, o TST editou a súmula 303, que determina o uso do art. 475 do CPC e não o art. 1º, V do Decreto-Lei nº 779:

Súmula nº 303 do TST

FAZENDA PÚBLICA. DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 71, 72 e 73 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I - Em dissídio individual, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, mesmo na vigência da CF/1988, decisão contrária à Fazenda Pública, salvo:

a) quando a condenação não ultrapassar o valor correspondente a 60 (sessenta) salários mínimos;

b) quando a decisão estiver em consonância com decisão plenária do Supremo Tribunal Federal ou com súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho. (ex-Súmula nº 303 - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003 - Lei nº 10.352, de 26.12.2001)
(...)


Já na lacuna ontológica há lei para o caso concreto, porém a norma está desligada da realidade social, de modo que não tem aplicação prática.

A lacuna ontológica tem estudo mais intenso no Direito Constitucional. É magistério de Luiz Wanderley dos Santos:

“É necessário que o texto constitucional tenha embasamento na realidade fático-social, para que seja obedecido, todavia contém disposições que não podem ser aplicadas, por exemplo, os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais arrolados no art. 7º, IV, IX, XVIII etc., não teriam eficácia socialmente se as estruturas políticas atuais fossem mantidas, visto que seriam imprescindíveis certos mecanismos de pressão, que obtivessem maior participação na economia. Nestas hipóteses a norma constitucional terá eficácia jurídica (sintática), embora não possua a social (semântica), por não ser efetivamente aplicada, já que está desligada da realidade social. Surgirá, então, a lacuna ontológica. Para que não se opere essa modalidade de lacuna, a norma constitucional deverá refletir a realidade social, evitando-se, assim, o perigo de um desvio entre o social e o jurídico, que levada à sua ineficácia semântica por falta de sintonia com a coletividade, que conduzirá à sua inaplicabilidade

Leia mais: http://jus.com.br/artigos/90/normas-constitucionais-e-seus-efeitos#ixzz3ZIG9BE3Q (SANTOS, Luiz Wanderley dos. Normas constitucionais e seus efeitos. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 26, 1 set. 1998. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/90>. Acesso em: 5 maio 2015.)”


Vejamos outro exemplo: Eis a redação do art. 802 e do art. 653, c, ambos da CLT:

Art. 653 - Compete, ainda, às Juntas de Conciliação e Julgamento: 

c) julgar as suspeições argüidas contra os seus membros;

Art. 802 - Apresentada a exceção de suspeição, o juiz ou Tribunal designará audiência dentro de 48 (quarenta e oito) horas, para instrução e julgamento da exceção.

§ 1º - Nas Juntas de Conciliação e Julgamento e nos Tribunais Regionais, julgada procedente a exceção de suspeição, será logo convocado para a mesma audiência ou sessão, ou para a seguinte, o suplente do membro suspeito, o qual continuará a funcionar no feito até decisão final. Proceder-se-á da mesma maneira quando algum dos membros se declarar suspeito.

§ 2º - Se se tratar de suspeição de Juiz de Direito, será este substituído na forma da organização judiciária local.


É que antes da Emenda Constitucional 24/99, que extinguiu a representação classista na Justiça do Trabalho, havia em cada junta de conciliação e julgamento um juiz do trabalho e dois vogais, sendo um representante dos empregadores e outro dos empregados.

Porém, atualmente tal procedimento não pode mais subsistir, pois não se pode aceitar que o magistrado de primeiro grau julgue sua prória parcialidade. Logo, há lacuna axiológica, pois a aplicação da CLT se mostraria injusta.

A solução encontrada foi utilizar o art. 769 da CLT conjugado com o art. 313 do CPC:

CLT: Art. 769 - Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

CPC: Art. 313. Despachando a petição, o juiz, se reconhecer o impedimento ou a suspeição, ordenará a remessa dos autos ao seu substituto legal; em caso contrário, dentro de 10 (dez) dias, dará as suas razões, acompanhadas de documentos e de rol de testemunhas, se houver, ordenando a remessa dos autos ao tribunal.


O entendimento adotado é majoritário. Seguem julgados de Tribunais Trabalhistas pátrios:

EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. COMPETÊNCIA FUNCIONAL. Com o advento da Emenda Constitucional 24/99, que extinguiu a representação classista no âmbito desta Especializada, o art. 802 da CLT não mais ostenta aplicabilidade e eficácia, na medida em que ninguém pode julgar a sua própria parcialidade, sob pena de patente ofensa aos princípios do juiz natural e do devido processo legal, pilares máximos da imparcialidade do órgão julgador na apreciação da lide, o que seria inconcebível caso o próprio juiz tido como suspeito decidisse sobre a sua parcialidade para atuação no processo. Assim, impõe-se a pronúncia de ofício da incompetência funcional para a análise da matéria, com consequente remessa das peças ao órgão competente para apreciação do incidente.
(TRT-18 58200900218004 GO 00058-2009-002-18-00-4, Relator: KATHIA MARIA BOMTEMPO DE ALBUQUERQUE, Data de Publicação: DJ Eletrônico Ano III, Nº 142, de 7.8.2009, pág. 16/17.)

RECURSO ORDINÁRIO - JUIZ DO TRABALHO DE PRIMEIRO GRAU - EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO - JULGAMENTO - COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO - ARTIGO 313 DO CPC - APRECIAÇÃO PELA PRÓPRIA AUTORIDADE EXCETA - NULIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS PRATICADOS DE FORMA SUBSEQUENTE À OPOSIÇÃO DA MEDIDA - PROVIMENTO DO APELO. 1. Após o advento da Emenda Constitucional nº 24/99 - que extinguiu a representação classista na Justiça do Trabalho, em consequência do que os seus órgãos de primeiro grau perderam a composição colegiada -, tem-se por insubsistente a regra da legislação ordinária inserta no artigo 653, “c”, da CLT, segundo a qual a exceção de suspeição do juiz é julgada pelo próprio juízo impugnado, passando a incidir, assim, o normativo constante do artigo 313 do CPC - de aplicação subsidiária mercê do artigo 769 da CLT -, que confere essa atribuição ao Tribunal. Isso se justifica no fato de que, ao contrário do que ocorre com a exceção de incompetência, em que o litígio trava-se diretamen...
(TRT-6 - RO: 114900532009506 PE 0114900-53.2009.5.06.0142, Relator: Pedro Paulo Pereira Nóbrega, Data de Publicação: 11/07/2011)